quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Que Mistérios Tem Pandora?



Ano passado, apareceu em minha casa uma gata com 5 filhotinhos.
Cuidei deles todos e arrumei donos cuidadosos. Castrei os 5 e também a gata.
Esta, queridíssima, não foi adotada por ninguém... Tenho uma conhecida que tem um gatil e disse que pode ficar com ela também. Mas ela não é gata de gatil. Ela é muito dócil, mais parece com um cão, de tanto que interage com a gente. Minhas 3 cachorras ainda não se acostumaram com ela, mas ela está morando na bancada da churrasqueira e está ficando bem lá. Nunca pensei que teria uma gata em casa, mas esta vai ficando, a menos que eu arranje uma dona que lhe dê o mesmo carinho, cuidados e conforto que eu dou. E estou muito feliz com isso.

Mas, o meu depoimento de hoje é sobre a Pandora, uma golden, que eu comprei de um rapaz que a maltratava. Ela chegou à minha casa com tantos traumas que passava o dia encolhida, as patinhas voltadas para dentro, olhinhos fechados, deitada no chão e fazendo xixi.
Depois de um banho, levei-a para dentro: ela não sabia andar dentro de casa e nem na grama.
À noite, meu filho levou-a para dormir com ele. Vocês não imaginam como essa cadela se transformou!. Brincava com 3 bolinhas de tênis, sem saber qual escolher.
Mas continuava com medo de tudo e de todos. Ninguém podia olhar para ela, que ela abaixava e fazia xixi. Barulhos, então, nem pensar!
Depois de 3 meses, consegui colocar uma coleira em seu pescoço. Depois de outros 2, consegui que ela desse alguns passos com a coleira.
Aos poucos fui andando com ela fora de casa, na rua, na rua vizinha, dando uma volta no quarteirão.
Hoje, caminhamos diariamente 6,8 km, ela solta, sempre ao meu lado, feliz da vida.
Ao voltar para casa ela entra na piscina e brinca muito com suas bolinhas.
À noite, quando meu filho chega, ainda bate uma pelada com ela. No domingo, dia do futebol oficial lá em casa, ela é o ser mais feliz do mundo, jogando bola com tantos garotos, que também a adoram. De toda a minha vida, a Pandora foi o melhor presente.



Rejane Pimenta vive em Brasília, trabalha num tribunal e atua silenciosamente pela causa animal.

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Para viver um grande amor


Adonias era um sujeito calado. Viúvo sem filhos, vivia só com suas saudades e manias. Felizmente, era saudável, pois, com o pouco que recebia da previdência, não poderia dar-se ao luxo de sustentar mazelas.
No pequeno quintal dedicava uma parte do dia a cuidar da horta e de um canteiro de flores, herança da falecida e, só por isso digno de sua atenção, já que importava-se pouco com a beleza ou o perfume delas.
Foi, porém, justamente nesse cantinho onde a terra era sempre fofa e úmida que ele, numa manhã muito fria, deparou-se com aquele parzinho de olhos assustados, vigiando-o por entre as folhagens. Pensou que fosse um rato, e lançou-se contra ele, para espantá-lo dali antes que ele fosse sapatear sobre suas verduras. Os olhinhos fecharam-se assustados, e a criaturinha encolheu-se toda, mas sem arredar o pé dali. Entre pétalas e folhas, o pequeno descortinou-se aos poucos, mas ele logo percebeu que o dono daqueles olhinhos cheios de curiosidade e medo era um cãozinho.
Adonias aproximou-se um pouco mais, desta vez com delicadeza. Tocou o bichinho com a ponta dos dedos e fez um carinho. Era o que faltava para que o pequenino saltasse de seu esconderijo saltitando, alegre e desengonçado à sua volta. Para sua surpresa, logo atrás dele veio outro cachorrinho, igualmente estabanado, atropelando o primeiro e enrolando-se com ele numa bola de pelos e patas que rosnava esganiçada.
Adonias sorriu diante daquela cena, surpreendido por esse movimento tão raro em seus lábios desde a partida da sua amada esposa. Sua vida não tinha mesmo lá muita graça, vivia, apenas, à espera do momento em que pudesse ir ao encontro dela.
Mas agora, observava os filhotes engalfinhando-se aos seus pés, enquanto sentia um sorriso definitivamente marcando sua face vincada. Acocorou-se para tocar neles e eles logo esqueceram sua brincadeira para agarrar-lhe os dedos com dentinhos afiados.
Adonias não sabia como aqueles filhotes haviam chegado ali, talvez alguém os tivesse jogado pela grade, mais baixa ao fundo do lote. Porém, costumava aceitar com resignação os desígnios de Deus e se eles estavam ali agora, é porque assim Ele queria.
Com delicadeza pegou os pequeninos. Sentiu uma enorme ternura em tocar-lhes a pelagem morna e macia. Levou-os para dentro, embora soubesse que não poderia ficar com eles: como sustentar dois cãezinhos se mal era capaz de se manter? Acomodou-os numa caixa com uma velha camisa de lã e os levou até a petshop mais próxima. Ficou surpreso ao saber que a loja não os receberia. O máximo que conseguiu deles foi algum desconto nas vacinas e ração. Ele aceitou a oferta e aproveitou para consultar um veterinário sobre a saúde dos bebês. Enquanto conversava com o médico, soube que muito perto dali, havia uma senhora que tinha muitos cães, todos recolhidos das ruas. Ela os resgatava, cuidava deles e colocava para adoção. Animado, ele levou os cãezinhos até ela.
Dona Sílvia foi muito gentil, mas explicou-lhe que não poderia ficar com eles. Estava com a lotação esgotada, endividada... e já completou:
– Como todos os outros protetores que conheço!
Então, contou a ele como é difícil ser protetor, manter um abrigo. O ideal é que todos fizessem o que ele estava fazendo: pegar os bichinhos e cuidar deles até eles encontrarem seus lares. Falou da importância da castração para diminuir a quantidade de animais abandonados nas ruas e lhe deu uma cartilha com algumas dicas de como cuidar de cães.
Em seguida, ela tirou fotos dos pequenos e montou alguns cartazes, que ele espalhou pelo comércio vizinho. Ela também o orientou a ter bastante cuidado na escolha dos adotantes, pois muita gente vem à procura de um bichinho movida pela emoção, sem pensar direito no que está fazendo e depois, acaba abandonando ou maltratando. Ela lhe mostrou alguns dos seus protegidinhos, resgatados nessas circunstâncias, todos muito machucados, magros, assustados, tristes.
Adonias saiu de lá profundamente angustiado. Não podia imaginar alguém fazendo mal àquelas criaturinhas. Não conseguia conceber que alguém fosse capaz de adotar um bebezinho daqueles para depois jogá-lo fora como lixo ou abandoná-lo. Voltou com eles para casa e passou a cuidar deles, enquanto aguardava por adotantes.
Não tardou muito, eles começaram a aparecer. Os filhotes eram lindos e as fotos de dona Sílvia, muito caprichosa e experiente, souberam explorar seus melhores ângulos. Assim, todos que viam os cartazes se encantavam com eles.
Adonias foi muito criterioso na escolha. Mesmo com tantos candidatos, levou mais de duas semanas para encontrar a pessoa certa. Até por isso, teve a sorte de encontrar uma moça muito carinhosa que quis adotar os dois juntos:
– Ai, que maldade! Separar os irmãozinhos! Já perderam a mãezinha deles... Nunca!
Adelaide era dona de casa e passava a maior parte do dia sozinha. Sentia falta de companhia e comprometeu-se a cuidar muito bem deles, a quem deu logo os nomes de Pongo e Joca. Ao perceber a insegurança de Adonias em entregar-lhe os filhotes, ela o convidou para conhecer o local onde eles viveriam. Era uma casa simples, a apenas duas quadras dali, com um quintal mais ou menos do tamanho do dele, bem arrumadinho, tudo muito limpo e protegido, os bichinhos não conseguiriam fugir e arriscar-se nas ruas.
– Eles poderão brincar aqui, mas viverão dentro de casa conosco. – ela disse. – Ah! E você pode vir visitá-los sempre que quiser!.
Adonias sentiu-se muito confiante em entregar-lhe os pequeninos. Entregou a ela também a cartilha recebida da dona Sílvia, com todas as orientações para ela cuidar dos cãezinhos e voltou para sua casa, aliviado por ter feito a coisa certa. Principalmente, quando ela lhe garantiu que providenciaria a castração dos dois.
Porém, nessas duas semanas em que conviveu com os bichinhos, sua vida havia mudado completamente. Agora, a casa estava ainda mais vazia e triste. Se um passarinho piava no quintal já pensava ter ouvido o latidinho de um dos cães, para lembrar, desapontado, que eles não estavam mais lá.
Adonias tentou retomar sua rotina, mas nada mais lhe dava prazer e, aos poucos foi descuidando da horta e das flores, que já davam mostras do abandono.
Porém, menos de um mês depois, Adelaide o procurou para perguntar se ele não poderia ficar com os cãezinhos por uns dias. Precisava fazer uma viagem de emergência a um parente adoentado e não confiaria seus pequenos Pongo e Joca a mais ninguém.
Adonias sorriu largo novamente. Foram dias de muita alegria e, ao mesmo tempo, de muita aflição, ao saber que logo os dois iriam embora outra vez. Mas isso serviu para lhe dar uma ideia: tão logo os cãezinhos foram embora, ele abriu um serviço de hospedagem e, sempre que algum dos vizinhos precisava viajar, sabia com quem deixar o seu bichinho de estimação. Com isso, sua renda aumentou um pouco e pode ajudar a dona Sílvia com seu abrigo. Também era para lá que ele ia sempre que estava sem hóspedes em casa, para dar uma forcinha. Habilidoso, melhorou todas as instalações do local, melhorando a vida dos cães e reduzindo o trabalho da velha senhora.
Adonias tornou-se logo o amigão de todos os cães do bairro.
Onde andava, rabinhos balançavam em cumprimento e os que ele mais gostava de ver balançando eram mesmo os de Pongo e Joca a quem sempre dava um jeitinho de visitar.
Ah! E o canteiro de flores da falecida acabou cedendo lugar a uma azaléia, árvore florida e frondosa, a preferida de dona Sílvia.


Nena Medeiros é protetora e escritora. Esta é uma história de ficção totalmente baseada em histórias reais que acontecem a pessoas de bom coração.
Por se tratar de uma história de ficção, a imagem foi "emprestada" daqui.

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

É a Vida, É Bonita e É Bonita!




Em 1993, em uma viagem de carro a Curitiba, visitei a Sociedade Protetora dos Animais e lá havia uma poodle cega abandonada. Naquela época alguém abandonar um cachorro de raça só porque ficou cego era inédito para mim. Eu havia perdido minhas 2 poodles tragicamente 4 anos antes. Quando vi a Mila, eu nem pensei, num impulso a coloquei dentro do carro e a trouxe comigo para Brasília. Mila havia vivido por 5 anos no pátio da SUIPA, um pátio quadrado circundado por casinhas, então ela só andava em círculos e dormia dentro de uma caixa de frutas, dessas de feira, pois os outros cães não a deixavam entrar nas casinhas.  Naquela época eu morava em apartamento. Dentro de casa a adaptação da Mila foi bem rápida, ela logo mapeou o lugar dos móveis e em poucos dias se sentia em casa, sem bater a cabeça em nada. Na rua levou uns 2 ou 3 meses para a Mila perder o condicionamento de andar em círculos e aprender a andar em linha reta. Como andava na coleira, logo nós criamos um código: uma puxadinha leve na guia significava um meio fio para descer, duas puxadinhas era pra subir. Em poucos meses a Mila adquiriu total confiança na mão que segurava a coleira, passou a andar mais rápido, e a não se assustar com os barulhos.  A Mila foi minha primeira adoção, e também minha primeira cachorra cega. Ela veio curar uma ferida de 4 anos, ferida aberta por ter perdido minhas 2 poodles tragicamente, uma atacada por outro cachorro e a outra atropelada, tudo ao mesmo tempo. A Mila reabriu as portas do meu coração e  me ensinou o quanto a gente se engrandece quando traz um cão abandonado para ser parte da família. Especialmente um cão deficiente.


Os anos passaram, muitos cães se foram deixando vazios enormes na minha alma, muitos outros chegaram e encontraram novos espaços (aqueles vazios nunca mais serão preenchidos, cada cão é único e deixa uma marca indelével no nosso ser), mas mesmo tendo 6 cães (na época) eu não sentia a minha família completa. Faltava alguém realmente especial, alguém que ninguém mais quisesse, faltava uma ceguinha na minha vida. Então procurando na internet descobri a Vida, no Abrigo  Augusto. Quando eu procurava uma ceguinha imaginava encontrar uma poodle ou uma cocker, cães que eu já tive e que é comum ficarem cegos. Não imaginava encontrar uma sheepdog. Me apaixonei desde a primeira foto que vi. A Vida tinha de ser minha, havia um lugarzinho esperando por ela no meu coração.
Sheepdog é um cachorro muuuuuito diferente de um poodle. E eu já não morava mais no apartamento, a vida em uma chácara tem uma outra dinâmica, a gente fica muito mais tempo do lado de fora da casa do que dentro dela. E havia outros 6 cães hiperativos e estabanados soltos no quintal. Ah, e o quintal tem nada menos que 10.000 metros e 370 árvores. Mas nada disso atrapalhou a adaptação da Vida na minha casa.

A primeira coisa que um cachorro cego se acostuma é com a voz do dono. Não é com o lugar dos móveis na casa, como eu havia pensado. A gente tem essa visão de que se localizar espacialmente é importante para o cachorro. Mas não é. Depois de uns 3 dias, quando a Vida aprendeu a reconhecer minha voz,  ela passou a uivar e ganir alucinadamente quando me ouvia chegar. Eu fiquei até preocupada se ela ia ficar bem enquanto eu saía para trabalhar. Como foi tosada logo que chegou, nos primeiros dias ela sentiu necessidade de abrigo, e resolveu que iria se esconder no meu closet! Por alguns meses eu tive uma sheepdog dormindo na primeira prateleira do seu closet! Mas cachorro se adapta rápido, e em poucos dias a Vida já conhecia meus horários, minha rotina, e o barulho do meu carro
Logo ela aprendeu a andar pela chácara toda. A Vida é muito auto confiante, só anda de cabeça erguida como se o mundo fosse todo dela. E não tem medo de bater em nada, se bater a cabeça numa árvore ela desvia e continua de cabeça erguida e peito estufado. Uma vez eu fiz um teste. A Vida estava num lado da casa. Eu saí pelo outro sem ela ver, e fui sem fazer barulho algum lá pro outro canto da chácara. De longe fiquei observando. Ela levantou, balançou o nariz, deu alguns passos. Balançou o nariz de novo, andou mais um pouco, virou para a esquerda, foi andando e balançando o nariz, e endireitando a rota, até chegar em mim. Ela nunca se perde na chácara. No começo eu tinha medo de deixar ela passear sozinha no quintal, ficar tomando chuva por não achar o caminho de casa. Que nada, isso nunca aconteceu. A Vida deita na frente da porta e fica com a cabeça levantada, só cheirando o ar. E sabe tudo o que está acontecendo. Ela é a dona da casa, os outros cachorros que passem por cima dela!


Mas o mais gostoso é que a Vida é totalmente grudada em mim! Ela não está nem aí para os outros cachorros (agora são 10!). Nem para os gatos. Mas não larga do meu pé nenhum segundo, eu vivo tropeçando nela dentro de casa. Sentar aos meus pés não é suficiente, eu tenho que sentar no chão, para ela ficar encostada em mim ganhando cafuné. Ou então ela deita em cima dos meus pés, pra não deixar eu sair de jeito nenhum, e eu tenho que ficar esfregando o pé na sua barriga. Ah, e a Vida adora visitas! porque visitas sempre fazem muita cafuné!!!
Acho que não tem cachorro no mundo mais feliz que a Vida. Nem dono mais feliz que eu! Enxergar? ah, isso é o de menos! Não faz a menor falta! Pergunte pra Vida o que ela mais quer nesse mundo e ela vai responder: só mais um cafuné!
Andréa Vidal  é servidora pública, mora numa chácara com 10 cães, 2 gatos e 5 cavalos. Todos adotados.